quarta-feira, 9 de julho de 2014

7 X 1 – o Brasil precisava desse choque de realidade


O Brasil precisava de um choque de realidade. Durante décadas, alimentado pelo ufanismo sem sentido das redes de televisão, parece que a única coisa que fazia do Brasil ser "o Brasil" era o futebol. O mundo nos "respeitava" por sermos o país do futebol. Éramos "a pátria de chuteiras". O único tecido social que nos unia de norte a sul era o futebol.

Desperdiçamos infindáveis recursos financeiros, materiais, tecnológicos e humanos em tudo o que tem a ver com futebol. Horas e horas de transmissões de rádio e TV, folhas e folhas de revistas, jornais, livros... Tudo falando sobre futebol. Brasileiros de destaque somente aqueles que têm envolvimento direto ou indireto com o tema.
O futebol é a única grande indústria seriamente consolidada no Brasil, lógico, com todo aquele ranço do "jeitinho brasileiro" em todos os espectros, em que somente se respeitam as leis e regras que convierem aos interesses da cartolagem. Sempre que "necessário", as regras eram torcidas e/ou distorcidas para beneficiar aos detentores do poder fora das quatro linhas. Assim, criaram-se verdadeiros feudos dentro do futebol brasileiro, vinculados ao grande feudo – FIFA – com aura de um deus tortuoso que tudo pode e tudo faz. Ainda assim, construiu-se ao longo das décadas uma "cadeia de produção" nacional voltada ao desenvolvimento do futebol. Que funcionou tão bem que fez com que o país fosse o que maior número de vitórias em Copas do Mundo obtivesse, já que, como todos bem sabem, "somos pentacampeões".
Fora do futebol, quase nada importa. A Educação está sendo esfacelada ao longo de décadas. A saúde está em situação calamitosa. A segurança ganha contornos de uma verdadeira guerra civil. Os transportes públicos funcionam pessimamente e os grandes centros estão praticamente parando em meio ao número crescente de veículos individuais. A corrupção é um problema endêmico na História do Brasil, sendo retroalimentada pela impunidade. Mas não tem problema: "somos penta"!
No futebol, reinávamos supremos. Éramos respeitados, temidos! A "amarelinha" intimidava adversários dos países desenvolvidos. E isso afagava nossos egos. Mas agora isso acabou! E talvez se levem décadas até que o Brasil recupere a confiança na capacidade de formar uma seleção, o que já vinha acontecendo desde 2006. É possível que nenhum de nós esteja vivo para ver novamente a seleção brasileira ser campeã de uma Copa do Mundo, tamanho o efeito que essa chacoalhada que o Brasil levou no Mineirão possa vir a ter.
O principal locutor da TV brasileira gostava de dizer que a Alemanha "faz algo parecido com o futebol, mas que dá certo", referindo-se ironicamente à forma técnica, porém, "fria", "sem criatividade", "sem talentos individuais", que era nossa marca registrada naquilo que achávamos que fazíamos melhor no mundo. Agora, esse choque de realidade mostrou que não é bem assim. Que a organização tática, a construção do talento da equipe, que a preparação metódica, articulada e integrada pode massacrar talentos individuais.

Que essa surra para a Alemanha nos inspire. Não dentro dos campos, mas fora deles: na organização social, política e econômica do país. Que o povo brasileiro acorde para o fato de que as vitórias ou as derrotas no futebol em nada acrescenta ou diminui nas nossas vidas. Que o povo brasileiro passe a cobrar dos políticos a mesma eficiência que cobra da seleção brasileira e dos times de futebol. Que use essa mesma energia, essa mesma capacidade de mobilização em prol do que realmente importa para todos nós: o desenvolvimento socioeconômico. Que busque o "padrão FIFA" na Educação, saúde, segurança, transportes, energia, etc. Assim como faz o povo alemão.