segunda-feira, 7 de março de 2016

Lula, o PT e as bandeiras de esquerda

O mandado de condução coercitiva imposta ao ex-presidente Lula na última sexta-feira, dia 04, acirrou os ânimos de petistas e antipetistas. Entre os extremismos é necessário resgatar a ponderação pelo mínimo de discernimento e racionalidade na política, algo cada vez mais difícil nesta nova era de extremos.

Lula deixando a Polícia Federal em Congonhas. 
Ex-presidente teve imposto um mandado de condução coercitiva para depor.
Foto: GloboNews, 2016.




Em princípio, é importante separar o suposto envolvimento do ex-presidente nos esquemas de corrupção dos acertos na condução das políticas sociais. Bem como separar o correto direcionamento destas políticas dos graves erros do respectivo financiamento público que originaram a contabilidade criativa e as pedaladas fiscais, estas objeto do pedido de impeachment da Presidente Dilma. Ou seja, separar o legado das políticas públicas da pessoa física que supostamente cometeu crimes contra o  patrimônio público.

O risco que corre o PT e os petistas na defesa ingênua e irracional do ex-presidente Lula, face a tantos indícios de corrupção é justamente comprometer o que chamam de legado. Porque ainda não se aperceberam de que grande parte da suposta "elite golpista" que tanto criticam quer exatamente isso: associar as corretas políticas de inclusão à corrupção inerente ao sistema político sujo que acompanha a própria história do Brasil. Nesse cenário, defender cegamente o ex-presidente é fazer exatamente o jogo dos detratores das políticas sociais. O que pode, por indução, colocar em xeque tais políticas.

Se a população, em algum momento, engolir a ideia de que algumas bandeiras da chamada esquerda, como o programa Bolsa Família, estão, sob qualquer hipótese, diretamente associadas à corrupção, então o Brasil estará fadado a dar gigantescos passos atrás rumo à involução socioeconômica.

As políticas sociais são tão importantes para o país quanto o Plano Real, que acabou com a hiperinflação e trouxe estabilidade à economia. E, ressalte-se bem, o Plano Real foi o primeiro grande passo a permitir a inclusão social, ao dar poder de compra às famílias de baixa renda.

Assim como o Plano Real não pode ser considerado um patrimônio do PSDB, as políticas sociais não são patrimônio do PT. Ambos são conquistas do povo brasileiro. Embora seja inegável a importância dos personagens que os possibilitaram, como FHC e Lula, estes não estão acima das conquistas que ajudaram a proporcionar. E muito menos da lei.

Portanto, a melhor coisa que os defensores de tais políticas deveriam fazer é, ao invés de tentar blindar o ex-presidente, blindar as conquistas em si. E, para fazê-lo, é importante assegurar o funcionamento das instituições democráticas livre de influências políticas com "p" minúsculo. As mesmas instituições democráticas que agora estão investigando Lula e seus supostos crimes.

Os petistas não deveriam acusar o juiz Sérgio Moro de estar a serviço dos interesses escusos golpistas da direita. Porque, ainda que estivesse, seria impossível fabricar tantas evidências de envolvimento nos escândalos que ora estão sendo apurados, não somente por Lula, mas pela cúpula do PT.

A esquerda em geral e em particular o PT deveriam diversamente cobrar das autoridades que houvesse um Sérgio Moro investigando com o mesmo rigor os escândalos da CPTM e da merenda escolar no estado de São Paulo. Exigir que as investigações do Ministério Público em todo o país sejam desvinculadas de interesses dos governadores e prefeitos. Que o Judiciário não seja indicado ou contra indicado pelo Poder Executivo.

Jogar contra o Ministério Público e contra o Judiciário significa jogar contra as instituições democráticas. O que, em última análise, representa jogar contra o próprio país. As investigações precisam ser concluídas e os culpados têm de ser punidos, independentemente do cargo que ocuparam e do partido ao qual estão filiados.

Caso contrário seria admitir a impunidade. E, consequentemente, admitir que alguns brasileiros devam gozar de mais prestígios do que outros. Exatamente o oposto do que preconizam as próprias bandeiras da esquerda que secularmente combatem as desigualdades.