1996,
Eldorado dos Carajás, sul do Pará.
João Pedro
tinha apenas 5 anos. Assistiu ao pai ser covardemente assassinado pela polícia
comandada pelo coronel Pantoja, juntamente com 18 outros sem-terra.
João Pedro
cresceu sem qualquer amparo do sistema de bem-estar social do Estado. A mãe,
viúva, teve de trabalhar exaustivamente em ocupações informais para dar
alimento aos filhos. Ainda criança, João Pedro ajudava a mãe e não pode ter
acesso à Educação e muito menos a oportunidades.
Ainda
adolescente, começou a se envolver em pequenos furtos. Vendia os objetos dos
furtos para comprar comida e roupas e ajudar a pagar o aluguel no barraco onde
morava com a mãe e os irmãos.
Com 19 anos,
praticava assaltos à mão armada. Envolveu-se com grupos de bandidos e começou a
fazer roubo de cargas pelas estradas em péssimas condições do estado do Pará. Até que foi
preso, condenado e passou a cumprir pena na Penitenciária de Altamira.
Na cadeia,
foi cooptado por uma facção criminosa que tenta obter o domínio dos presídios
de todo o país. Em 2019, na
guerra entre as facções, João Pedro foi assassinado pela facção rival e teve a
cabeça decepada.
A mãe de
João Pedro, desesperada para ter notícias do filho, fez acampamento do lado de
fora da Penitenciária de Altamira, tal como fazia em 1996 nos acampamentos dos
sem-terras. E a pior
notícia veio: João Pedro era um entre os 58 assassinados na Penitenciária de
Altamira do Pará.
Três dias
depois, enquanto aguardava a liberação do corpo do filho, sentia o cheiro
fétido de carne humana em putrefação e assistia aos voos dos urubus que pelo
odor eram atraídos.
Com lágrimas
nos olhos e dor no peito, a mãe de João Pedro ouvia as notícias no pequeno
rádio que trouxera. E sentiu
repugnância ao ouvir as palavras do chefe de Estado brasileiro, quando
perguntado o que achava do massacre de Altamira:
– Pergunta
para as vítimas que morreram lá o que eles acham, depois que eles responderem
eu respondo a vocês.
Nem o cheiro
fétido de carne humana em putrefação havia causado tamanha náusea na mãe de
João Pedro, a qual não conteve o vômito ao ouvir as palavras irônicas
sadicamente enunciadas pelo chefe do Estado brasileiro.