Em 2013, "vem pra rua" significava outra coisa

Junho de 2013. O país inteiro, indignado com o estado de absurdos seculares no Brasil, transfigurados em mais um dos meros aumentos da tarifa de transporte público nas capitais, levantou-se em um uníssono sob o lema "vem pra rua"!

#VemPraRua 2013
Indignação contra toda a classe política
Foto: UOL, 2016.

A indignação era contra toda a classe política brasileira. Contra as negociatas em todos os níveis da administração pública, União, Estados e Municípios. Contra os superfaturamentos nas obras públicas. Contra os absurdos privilégios à custa do contribuinte. Contra os feudos de poder político que dominam o Brasil há décadas. Contra os péssimos serviços públicos prestados em meio a uma carga de tributação de primeiro mundo, arrecadada de forma socialmente injusta e economicamente ineficiente.

De 2013 para cá, tudo mudou. A indignação, que era geral, tornou-se seletiva. Se antes todos os políticos de todos os partidos se sentiram momentaneamente coagidos pela fúria da população, agora, grande parte desses mesmos políticos, muitos dos quais envolvidos nos mesmos escândalos de outrora, posam de grandes heróis nacionais. Ainda que seus nomes apareçam em similares escândalos, eles têm a desfaçatez de se apresentarem como bastiões da Ética e da moralidade.

Os bastiões da Ética e da moralidade!
São estes aí que vão governar o Brasil "livre da corrupção" quando o atual governo corrupto cair? Os mesmos que estão envolvidos em inúmeros escândalos???
Foto: Jornal GGN, acesso em 2016.

O cenário das manifestações convocadas para o próximo dia 13 agora tem outro significado. De forma inexplicável, o sentimento cívico de 2013 foi distorcido. E passou a servir aos interesses de uma das máfias de poder político interessada em destronar a outra máfia ora no poder.

Pior: o equilíbrio entre o jogo de forças que se alterna desde 1994 agora ameaça pender apenas para um lado. Lado este que já ocupou o poder e chafurdava em similares denúncias de escândalos de corrupção e incompetência na gestão pública como os que vêm à tona hoje praticadas por quem à época se advogava a bandeira da Ética.

Capas da Veja - FHC
O PSDB hoje posa de salvador da pátria.
Mas quando estava no poder chafurdava em escândalos de corrupção.
Fotomontagem: Conversa Afiada, 2016.

A corrupção da máfia de outrora apresentava um agravante: jamais seguia o caminho do judiciário e morria nas gavetas de procuradores nada interessados em fazer a verdadeira justiça pelo péssimo uso dos recursos públicos. Os mesmos que agora cinicamente bradam às câmeras por justiça. Um ciclo contínuo e inesgotável de hipocrisias que impera na política brasileira.

Capas da Veja - Lula e Dilma
O PT chafurda em escândalos de corrupção.
Quando estava na oposição se apresentava como bastião da Ética e da competência.
Fotomontagem: Veja (acervo digital), 2016.

E esta é a faceta mais perversa da distorção do sentido original do "vem pra rua": o esvaziamento do propósito de mudança geral para o fortalecimento de uma das máfias. Muitos dos que estavam em 2013 não estarão no dia 13. E muitos dos que estavam em 2013 estarão no dia 13 sem perceber que foram subtraídos para serem usados como massa de manobra da máfia interessada em voltar ao poder. Agora, sem oposição, já que qualquer crítica a esta máfia passa a ser entendida como simpatia à outra máfia. Triste para o Brasil! Muito triste!

Eu estava no "vem pra rua" de 2013. Vivi o sentimento da época. Embora uma parte de mim torça pelo impeachment, não estarei no dia 13, assim como não estive em nenhuma das manifestações de 2015. Não servirei a esta espécie de circo de aberrações ideológicas que se tornou o "vem pra rua" de agora. Não ajudarei a fortalecer a outra máfia. Não carregarei comigo essa culpa. Continuarei lutando para reascender o espírito do "vem pra rua" de 2013, ano em que nosso povo teve o último espasmo de esperança da verdadeira mudança.

Em 2013 eu estava lá. Este ano não estarei. 

Torço pelo impeachment, mas não ajudarei a fortalecer a outra máfia.