Na
última semana um caso chocou o Brasil. A recém-contratada apresentadora da sessão
sobre a previsão do clima no Jornal Nacional da Rede Globo, Maria Júlia Coutinho, foi alvo de
comentários preconceituosos devido à cor de sua pele.
Percebeu
que não usei a palavra "racismo"? De fato, fico profundamente
incomodado quando tenho de usá-la por força da situação. Por uma razão bastante
simples: não existem raças humanas.
O
projeto GENOMA humano, concluído em 2003,
comprovou o que já se suspeitava: a espécie humana é uma só e não é subdividida em raças, conforme algumas teses
seculares pressupunham. Então, como se caracterizam as diferenças entre a cor
da pele, o formato dos olhos e dos cabelos? O que faz um negro ter pele escura
e um japonês ter olhos puxados?
Essas
diversidades são formadas por diferenças genéticas tão sutis que o projeto
GENOMA definiu que elas não se diferenciam em "raças". São apenas características étnicas. De fato, há tantas diferenças genéticas
entre indivíduos de uma mesma etnia quanto entre indivíduos de etnias diferentes.
Assim,
não há raça negra, raça branca, raça asiática e raça indígena. Isso não faz
sentido do ponto de vista genético. Há etnia negra, etnia branca, etnia
asiática e etnia indígena. Ou seja, referem-se apenas às localidades geográficas de onde tais povos se fixaram.
A
palavra "racismo", portanto, não faz mais sentido diante do
conhecimento científico do século 21. Deveria ser substituída pelo vocábulo
"etnofobia", que caracterizaria a aversão a determinadas etnias. Seria a expressão menos errada, digamos assim, para caracterizar o que hoje é chamado de "racismo".
Mas por
que ainda usamos a palavra "racismo"? No Brasil, a manutenção da
palavra parece guardar forte relação com a lei nº 7.716 de 1989, que
passou a tipificar o crime contra etnias. Curiosamente, o texto da lei traz no
seu artigo 1º as duas palavras, "raça" e "etnia": "serão
punidos, na forma desta lei, os crimes resultantes de discriminação ou
preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional". 1
Defendo
que uma forma de isolar ainda mais as atitudes "racistas" seria abandonar a
expressão "racismo". Assim, um "etnofóbico" seria, além de
criminoso, absolutamente estúpido do ponto de vista científico! Porque estaria
baseando suas teses e/ou ações discriminatórias em teorias que já foram
derrubadas pela ciência contemporânea.
O "racista" dificilmente deixará de ser "racista". Mas a vítima de etnofobia, ao usar a palavra "racismo", acaba inconscientemente reforçando a premissa falsa da existência de raças distintas e inferiores.
Vítimas
de etnofobia devem refletir a respeito da extinção de qualquer coisa que remeta
ao conceito equivocado de "raças humanas". A superação da própria
palavra "racismo" potencializaria um salto de qualidade no combate à
discriminação. Afinal, como a ciência comprovou, as etnias humanas apresentam
diferenças sutis quanto à pigmentação da pele, formato dos olhos e do cabelo,
mas todas as etnias são absolutamente iguais quanto
ao intelecto.
Se
há grupos de origens étnicas em situação econômica e social pior do que os demais, isso se
deve única e exclusivamente a aspectos políticos e históricos. Jamais devido a
diferenças intelectuais.
Enfim,
para reflexão, deixo uma frase de um artigo dos professores Sérgio D. J. Pena
(bioquímico) e Telma S. Birchal (filósofa) da UFMG:
"Embora por si só a ciência
não seja capaz de gerar uma Ética, ela traz elementos que contribuem para a
reflexão Ética e que ampliam o campo no qual podemos exercer nossa liberdade". 2
Referências:
1 PLANALTO. Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7716.htm,
acesso em 04 de julho de 2015.
2 PENA, S. D. J.
BIRCHAL, T. A inexistência biológica versus a existência social de raças humanas:
pode a ciência instruir o etos social? Revista USP, São Paulo, n.68, p.
10-21, dezembro/fevereiro 2005-2006, pág. 19, disponível em http://www.usp.br/revistausp/68/02-sergio-telma.pdf,
acesso em 04/07/2015.