A geração que viveu a
juventude durante a década de 1950 talvez seja a última que tenha conseguido
lidar naturalmente com o envelhecimento. Pais na primeira geração dos “babies boomers”, aquela geração vinha de
um tempo em que envelhecer era algo quase nobre. Os mais jovens tinham absoluto
respeito pelos idosos. Desrespeitar um idoso – sob qualquer aspecto – era
condenável. No entanto, aquele respeito era derivado de certo medo.
Até o fim da década de 1950, a estrutura rígida da família concedia certo status aos mais velhos. Avôs eram tidos como verdadeiros líderes. Sua palavra tinha força de lei na família. Aprovação ou veto a qualquer decisão das famílias era a palavra final dos idosos. As crianças tinham até medo de olhar para seus avôs. Paravam de brincar em sinal de respeito e resguardo quando o avô ou a avó adentravam o recinto.
Àquela época, o tratamento
concedido às crianças não se distinguia daquele concedido aos adultos. Assim
como eram tratados adolescentes e jovens. Até no que diz respeito ao vestuário.
As roupas das crianças eram cópias em miniaturas das dos adultos. Não havia
indústria destinada à moda infantil ou infanto-juvenil, tal como existe hoje.
Bem como não havia cinema infantil, nem músicas para jovens.
Na década de 1960, quando
o rock ‘n’ roll se expandiu em todo o mundo, nasceu a indústria
orientada ao público jovem. Música, trajes, costumes, toda uma cultura, enfim,
passava a ser centralizada na figura do jovem. A rebeldia contra hábitos que,
então, passaram a ser considerados arcaicos, tornou-se uma bandeira mundial. Enquanto
davam à luz à geração X, cultuavam o “faça amor, não faça
a guerra”, um lema que exalta a vida em contraste aos horrores da guerra. Associado
ao advento da pílula anticoncepcional, o lema liberou os jovens para usufruir
das maravilhas do sexo livre dos preconceitos religiosos e outros tabus de uma
sociedade retrógrada.
Assim, injustamente, os
idosos passaram a ser sinônimos do retrógrado, do ultrapassado, do arcaico,
como se todos fossem igualmente responsáveis pelo subjugo de séculos, quiçá,
milênios. Desde então, é comum a zombaria dos jovens quando algum idoso está
perto, ainda que o coitado não tenha mencionado qualquer palavra. Só a
presença, ali, é como se quisesse bronquear contra a atitude displicente e
irresponsável daqueles “jovens perdidos”. Portanto, um símbolo vivo de
arcaísmo.
Curioso, agora, é o fato
de que os idosos da década de 2010 são aqueles mesmos jovens rebeldes que
encabeçaram as revoluções da década de 1960. Ao final desta década, terão quase
oitenta anos. Serão “velhos”. E serão acusados pelos mesmos “crimes” de que
eram acusados os idosos do tempo em que eram jovens: o retrocesso, o
ultrapassado, o arcaico. Ironicamente, sofrerão preconceitos análogos àqueles
contra os quais lutaram na juventude, só que, agora, “do outro lado do balcão”:
assim como os velhos de 50 anos atrás os acusavam de inconsequentes por serem
jovens “despreparados” lutando por “ideais perdidos”, serão, agora, rotulados
de “retrógrados” somente por serem idosos!
E aquela geração, a dos
rebeldes dos anos 1960, terá de promover outra “revolução”: a da ocupação de um
espaço socioeconômico para a velhice. Porque – fazendo, aqui, uma caricatura –
99% da indústria de hoje são destinadas direta ou indiretamente aos jovens e o
1% restante é destinado à produção em larga escala de itens para se manter
jovem, ou minimizar os efeitos da idade. Exageros à parte, aquela geração terá
de se engajar no lema “old is beautiful”, quando, obviamente, não há nada de
bonito, convenhamos, em envelhecer.
Pior: tal geração lida
muito, muito mal com o próprio envelhecimento! Lidam tão mal que muitos acabam
se sujeitando ao ridículo e ao absurdo. Cirurgias plásticas originam criaturas esquisitas.
Há uma total falta de noção em cultuar hábitos de seu tempo de jovem – ou,
pior, dos jovens de hoje. Gastam fortunas em toda a sorte de cosméticos e
elixires que prometem juventude prolongada... Enfim, a busca da “fonte da
juventude”, agora, em escala industrial, potencializada pelo Viagra. Mas que
somente serve para enriquecer as mesmas estruturas “arcaicas” contra as quais
lutaram 50 anos atrás!
E as gerações pós jovens
anos 1960 também sofrerão com o envelhecimento. A minha geração lida muito mal
com o envelhecer – e mal está chegando aos 40! Se outrora o envelhecimento era
um ônus natural à contrapartida da aquisição de vasta experiência, agora é
somente um ônus. Ninguém quer contratar um idoso no mercado de trabalho.
Ninguém quer conviver com um idoso. Ninguém quer nem escutar um idoso. É como
se fossem verdadeiros expatriados!
Eis o desafio: como tornar
novamente o envelhecimento algo nobre. E não será com expressões politicamente
corretas como “terceira idade” ou a odienta “melhor idade”. Tampouco com a
nascente “indústria da terceira idade”, que quer, em última instância,
aproveitar-se das aposentadorias e pensões dos idosos. Trata-se de promover um
novo equilíbrio. Porque o foco da sociedade saiu do 80 para o 18. Todavia, o 18
se mostrou tão retrógrado e preconceituoso quanto o primeiro. Trata-se, enfim,
de estabelecer algo que até hoje não aconteceu: o respeito mútuo em todos os
níveis, seja cor, sexo, crença ou idade.